Qual a definição de sustentabilidade? Significa o mesmo que proteção ambiental? Que tipos e exemplos de sustentabilidade existem? Vamos descobrir.
O desenvolvimento sustentável e a sustentabilidade
O termo sustentabilidade deriva da ideia de desenvolvimento sustentável introduzida em 1987 através do relatório de Brundtland, também conhecido como Our Common Future.
Nele é definida pela primeira vez a ideia de desenvolvimento sustentável - a capacidade das gerações presentes satisfazerem as suas necessidades sem comprometer a capacidade das gerações futuras satisfazerem as suas próprias necessidades.
"(...) um processo de transformação no qual a exploração dos recursos, a direção dos investimentos, a orientação do desenvolvimento tecnológico e a mudança institucional se harmonizam e reforçam o potencial presente e futuro, a fim de atender as necessidades e aspirações humanas."
Comissão Mundial do Meio Ambiente e Desenvolvimento, Relatório de Brundtland, 1988, p. 49)
É desta definição de desenvolvimento sustentável que é comumente extrapolada a definição de sustentabilidade.
Assim, torna-se também mais fácil percebermos que, apesar do termo sustentabilidade ser muitas vezes utilizado como equivalente a algo que é ecológico, verde, ou "amigo do ambiente", é um termo muito mais vasto e complexo.
Para além da dimensão ambiental, há outros tipos de sustentabilidade que são fundamentais para se tentar cumprir o propósito de satisfação das necessidades presentes e futuras.
Da sustentabilidade para a regeneração
O termo "sustentabilidade" tem sido amplamente utilizado para caracterizar melhorias em áreas como:
1. A sobreexploração de recursos naturais;
2. A produção de bens e as operações aí envolvidas (ao nível do uso de energia, matérias primas e subprodutos poluentes);
3. O consumo linear (produção, descarte, lixo) de produtos;
4. A direção e o propósito de determinados investimentos;
5. O estilo de vida das pessoas;
6. A utilização responsável de dispositivos eletrónicos, etc
Assim, desde que uma ação dentro das áreas acima mencionadas cause menor, pouco ou nenhum dano ao meio ambiente, o termo sustentabilidade é muitas vezes usado de forma pouco reflectida - uma vez que, como vamos ver em seguida, tem um significado muito mais amplo.
Daniel Christian Wahl, autor do livro Design de Culturas Regenerativas onde são difundidas várias ideias do movimento regenerativo - incluíndo as de Bill Reed (2007) - defende que a sustentabilidade deve antes ser vista como:
O padrão subjacente de saúde, resiliência e adaptabilidade que mantem o planeta numa condição onde a vida, enquanto um todo, pode florescer e criar mais condições propícias a que se gere mais vida.
Daniel Wahl, Culturas Regenerativas (2020)
Para esta visão se tornar realidade, a forma como a sociedade moderna está estruturada não deve ser sustentada - até porque é algo impossível no longo-prazo se a lógico de consumo e crescimento económico infinito se mantiver - mas antes re-desenhada segundo uma perspectiva regenerativa.
Mais adiante vamos explorar mais sobre o movimento regenerativo mas para já vamos continuar a olhar para a sustentabilidade nos dias de hoje.
Tipos e dimensões da sustentabilidade: ambiental, social e económica
É frequente lermos que a sustentabilidade tem 3 eixos fundamentais e, como consequência, encontrarmos termos como "sustentabilidade ambiental", "sustentabilidade social" ou "sustentabilidade económica".
Estes 3 termos, também conhecidos como o triple bottom line ou o tripé da sustentabilidade, foram criados/difundidos por John Elkington (uma das principais figuras na área da sustentabilidade nas empresas) na década de 90 através do seu livro Cannibals with Forks: Triple Bottom Line of 21st Century Business.
Há uma versão digital do livro em PDF disponível aqui.
De forma sumária, no contexto em que Elkington trouxe a ideia de triple bottom line, esta representa uma metodologia que examina o impacto ambiental, económico e social de uma empresa.
A ideia era/é encorajar empresas a monitorizarem e gerirem o valor económico, social e ambiental que acrescentam ou destroem.
Mas antes de nos debruçarmos rapidamente sobre cada um destes pilares, é importante notar que o próprio Elkington reconheceu, no seu mais recente livro Green Swans: the Coming Boom in Regenerative Capitalism (2020), que o triple bottom line é insuficiente e tem inclusive sido mal utilizado.
Há uma rúbrica do próprio na Harvard Business Review que explica a desilusão com o rumo tomado pelo termo que foi/é muito usado por várias empresas como mote para mostrarem pequenas mudanças que estão longe de se traduzir nas mudanças significativas de que precisamos urgentemente.
O que é a sustentabilidade ambiental? Definição e exemplos
Esta é provavelmente a dimensão da sustentabilidade mais conhecida.
Ser-se ecológico diz respeito a algo ou alguém que tem respeito pela natureza com o foco de não causar danos ao meio ambiente, certo?
No entanto, o "grau de respeito" é relativo.
Por isso, podemos dizer que cortar algumas árvores numa floresta densa para construir um abrigo para um guarda florestal não é ecológico mas nem por isso (a intenção ou a consequência maior) é insustentável. Na verdade, pode até ser visto como um mal menor.
No entanto, abater uma fatia grande desta floresta para reconverter esta área para agricultura ou para silvicultura de curta-duração (i.e. o crescimento e corte rápido para utilização como biomassa) terá, à partida, elevadas implicações ao nível de perda de biodiversidade, do carbono que é libertado, da saúde do solo que fica mais exposto à erosão ou no ciclo da água que depende das raízes das árvores para se infiltrar.
Assim, o abate desta fatia de floresta, tendo em conta a magnitude do seu impacto e as suas repercusões, não será, à partida, nem ecológico ou sustentável.
Neste sentido, a sustentabilidade ambiental inclui uma visão maior do tema do ambiente e está tipicamente associada a ações que não comprometem a capacidade de auto-regulação da Biosfera nas suas diversas vertentes.
Muitas vezes, quando pensamos em sustentabilidade ambiental, pensamos em impedir, não contribuir para, ou mitigar as alterações climáticas e/ou o aquecimento global - que não são a mesma coisa.
No entanto, será mais correto pensarmos no pilar ambiental da sustentabilidade como as ações que não contribuem para que os limites planetários (ver figura abaixo) atinjam pontos críticos.
Assim, a sustentabilidade e o futuro da humanidade e da vida na Terra dependem da proteção da biodiversidade e dos processos biofísicos que regulam o clima, o ciclo da água e o ciclo do carbono - em conjunto com uma série de outros subsistemas de suporte da vida na Terra.
Para quem tenha interesse em explorar o tema dos limites planetários, saiu recentemente (Maio 2021) um documentário na Netflix que vale a pena explorar (ver trailer abaixo).
Quando falamos sobre sustentabilidade de uma perspectiva sistémica, muitas vezes o que estamos a tentar "sustentar" não é apenas o futuro da humanidade mas o padrão de interdependências ecológicas (como as cores ou formas geométricas) pelas quais a Natureza se auto-organiza e a saúde planetária da qual todas as espécies dependem.
É este padrão de saúde que nos permite permanecer responsivos, adaptáveis e resilientes diante das mudanças. Melhorar a resiliência da comunidade e prestar atenção ao efeito das nossas ações em escalas múltiplas e interconectadas está no cerne da criação de comunidades prósperas e de culturas sustentáveis.
Gaia Education (2021), Worldview Dimension
A sustentabilidade ambiental de uma perspectiva empresarial
De uma perspectiva empresarial, a sustentabilidade ambiental implica olhar para as emissões de gases de efeito de estufa - diretas e da cadeia de valor - de uma organização e procurar eliminá-las ou minimizá-las ao máximo.
Implica igualmente olhar a outros impactos que a atividade empresarial possa - direta ou indiretamente - ter, por exemplo, ao nível da poluição e contaminação de uma região (ex: descargas poluentes em rios) ou ao nível da perda de biodiversidade.
Na questão da biodiversidade, esta pode decrescer como consequência de descargas poluentes em rios, mar ou terra; devido a efeitos colaterais do uso de fertilizantes, pela construção de barragens que alteram o fluxo da água afetando ecossistemas a jusante, pela reconversão de territórios (florestas, pântanos, prados) para monoculturas agrícolas...
Este tipo de impactes - impactos causados pelo Homem - ambientais têm geralmente consequências sociais e económicas que vamos explorar em seguida.
Resumindo - o que é então a sustentabilidade ambiental, dentro de uma lógica empresarial?
É a ideia de que os recursos naturais devem ser conservados de forma cuidada, o que implica ações empresariais/individuais (dos colaboradores) para minimizar os impactos negativos dos diversos setores e indústrias.
A sustentabilidade ambiental de uma perspectiva pessoal
De uma perspectiva pessoal ou individual, a sustentabilidade ambiental pode ser vista como a redução dos impactes ambientais causados - direta e indiretamente - pelo nosso estilo de vida.
A este respeito, a poupança de água ou de electricidade, a utilização de transportes públicos, a redução de viagens de avião, o tipo de dieta alimentar, o consumo moderado e consciente, ou o offset carbónico são algumas das ações mais importantes a considerar.
Idealmente, todos mediríamos as nossas pegadas carbónicas - o impacto carbónico gerado pelos produtos/serviços que consumimos - e reduzi-lo-íamos gradualmente.
No entanto, a dificuldade/incerteza/esforço de medição da pegada, a inacessibilidade e/ou o preço mais elevado de soluções alternativas mais ecológicas - também chamadas de green commodities -, fenómenos de greenwashing ou a comparação com outros que não trilham o mesmo caminho são fortes barreiras a estilos de vida mais ecológicos.
O que significa sustentabilidade social? Exemplos e definição
A sustentabilidade social envolve tipicamente um olhar crítico para a forma como as nossas sociedades estão estruturadas dentro de várias dimensões - ao nível de abrigo, energia, alimentação, segurança, educação, acesso a água...
De uma perspectiva empresarial, a sustentabilidade social é tipicamente analisada ao nível da cadeia de valor de um produto.
Imaginemos que a marca TSHART produz t-shirts de algodão. Para aferir se é socialmente sustentável é preciso responder a algumas perguntas.
Os trabalhados diretamente contratados - para fazer vendas, marketing, recursos humanos, etc - pela TSHART tem condições dignas de trabalho? Têm um horário de trabalho razoável? Tem um salário digno, justo e não são discriminados?
E os trabalhadores que estão indiretamente ligados à TSHART, responsáveis pela apanha de algodão ou pelo trabalho em fábrica - que tipicamente estão em países mais distantes com políticas sociais mais questionáveis - usufruem também desses mesmos direitos?
No fundo a intenção da sustentabilidade social é garantir que os direitos humanos são respeitados, que há igualdade de oportunidades e que estão a ser promovidas sociedades mais justas, inclusivas e diversas.
No entanto, não basta adotar medidas circunstanciais e isoladas na procura de melhores resultados sociais pois tal como a dimensão ambiental da sustentabilidade, também a dimensão social está diretamente (e fortemente) dependente da dimensão económica.
Nem a compensação carbónica - por exemplo plantar árvores que absorvem CO2 para compensar as emissões de uma fábrica - nem a filantropia são soluções sérias e eficazes (apesar de serem muito importantes no curto-prazo) para problemas ambientais ou sociais.
É preciso olhar à raiz, i.e., à causa principal dos problemas. E muitas vezes, essa raiz tem uma forte componente económica.
Definição e exemplos de sustentabilidade económica
Este é o pilar menos consensual da sustentabilidade.
Por um lado, entidades como o Business Council for Sustainable Development em Portugal definem-na como:
A prosperidade em diferentes níveis da sociedade e a eficiência da atividade económica, incluindo a viabilidade das organizações e das suas atividades na geração de riqueza e na promoção de emprego digno.
BCSD Portugal
Isto envolve que as empresas procurem crescer economicamente causando menos danos ambientais - economizando recursos, trabalhando com matérias-primas recicladas e/ou recicláveis ou investindo em projetos de recuperação/offset ambiental.
No entanto, serão as ideias de "crescimento" e redução de impactos ambientais compatíveis?
Vários estudos e autores têm vindo a chamar cada vez mais à atenção para o facto de que não pode haver sustentabilidade numa economia que depende da exploração constante dos recursos do planeta. É por isso que o ODS (objetivo de desenvolvimento sustentável) número 8, intitulado promover o crescimento económico, é bastante discutível.
Um artigo recente publicado na Scientific American intitulado "The Delusion of Infinite Economic Growth" concluiu que mesmo tecnologias "sustentáveis" como carros elétricos ou turbinas eólicas estão sujeitas a limites físicos impenetráveis e têm enormes custos ambientais.
Os autores deste estudo argumentam que há uma ligação intrínseca entre o consumo de materiais e o produto interno bruto (PIB) - a forma (insuficiente) como atualmente se mede o sucesso de um país/economia. E que esta ligação torna o paradigma de crescimento económico infinito incompatível com a sustentabilidade.
Este fenómeno foi bastante visível durante a pandemia.
Por um lado, conseguimos as tão procuradas reduções de emissões de gases de efeito de estufa (ainda que temporárias e que já tenham voltado a disparar), fruto de reduções no consumo energético, nos transportes ou na exploração/consumo de materiais.
O planeta sorriu.
Por outro lado, seguiu-se - e seguir-se-á - um colapso social e económico global que tornou evidente e inequívoco esta ligação ambiente-economia-sociedade.
No fundo, o desenvolvimento económico implica mais produção e mais consumo, o que leva a um maior uso de recursos, a mais emissões e a mais poluição.
A solução?
A sustentabilidade precisa de uma economia diferente
Podemos olhar para a solução para esta tríade economia-sociedade-ambiente de duas formas:
1. Por um lado, aceitando a possibilidade constante de re-estruturar a economia - que ao contrário da física é uma ciência social e não exacta -; e trabalhando ao nível do fortalecimento de trocas locais, regionais e nacionais, numa ótica circular e de valorização do "capital" natural e humano.
Há vários movimentos e teorias que exploram algumas destas questões em maior detalhe, entre elas o decrescimento sustentável.
2. Por outro lado, devemos também adotar um olhar regenerativo para a forma como a sociedade está estruturada e revê-la, analisá-la e adaptá-la tendo em conta a saúde dos ecossistemas e os princípios naturais/físicos. Aceitando que a tecnologia, por muito importante que possa ser na transição para a sustentabilidade, se não for acompanhada por um redesenho do estilo de vida da sociedade, é insuficiente.
Alguns dos princípios de aproximação da economia à forma como a Natureza funciona e está estruturada foram sintetizados por John Fullerton, ex-JPMorgan e fundador do Capital Institute.
O quarto pilar da sustentabilidade: a visão do mundo
Todas as perspectivas, por mais úteis, detalhadas e carregadas de evidências (científicas) que sejam são apenas uma perspectiva parcial de quem as adota.
Todas as perspectivas têm blindspots e efeitos colaterais que são uma consequência da informação/estímulos nos quais focamos a nossa atenção. Em consequência, devido à nossa capacidade limitada de análise, há inevitavelmente ângulos são ignorados ou desvalorizados - mas que nem por isso são menos importantes.
De acordo com da Gaia Education, o ângulo morto da visão ocidental dominante é que a ligação entre a natureza e a humanidade, bem como a nossa dependência do sistema de suporte de vida da Natureza, foi sendo gradualmente desvalorizado à medida que a civilização se moveu para áreas urbanas.
Temos tentando prever, manipular e controlar os processos naturais para o nosso benefício no curto-prazo, em detrimento do longo-prazo das gerações futuras e da vida na Terra.
Para ultrapassarmos a crise planetária de "visão de mundo", que está no centro das crises ambiental, social e económica que hoje vivemos, temos de superar, individualmente e coletivamente, a ilusão antropogénica e generalizada de que estamos separados da natureza.
Já é possível integrar algumas conclusões científicas de áreas como a física, a ecologia e a neurociência e contar uma história diferente - sobre sermos participantes num universo em expansão e transformação num planeta vivo que se autoregula. É sobre isto que o movimento da Deep Ecology se debruça.
[Créditos de imagem: Alex Cantarelli, Rahul Shah, Alexander Schimmeck no Unsplash]